A existência de uma “grave crise habitacional” é assumida na proposta de Orçamento do Estado para 2026 (OE2026), com o Governo a apontar como solução a existência de um travão na “escalada de preços, que passa sobretudo por um aumento decisivo da oferta habitacional”. São várias as medidas relacionadas com o setor imobiliário e com o segmento residencial que constam no documento, apresentado esta quinta-feira (9 de outubro de 2025) pelo ministro de Estado e das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, no Ministério das Finanças, tendo o mesmo já sido entregue no Parlamento, um dia antes do fim do prazo. Explicamos, em detalhe, o que vai mudar no setor.  

proposta de OE2026, recorde-se, vai ser discutida e votada na generalidade entre 27 e 28 de outubro. A votação final global está marcada para 27 de novembro, após o processo de debate na especialidade.

  1. Como quer o Governo “travar” a crise na habitação?
  2. Mudanças para o setor previstas na proposta de OE2026 
    1. Transferência de imóveis rústicos de domínio privado do Estado para municípios
      1. Luz verde para revisão dos Planos Diretores Municipais
      2. Sistema de Informação e Gestão de Património Imobiliário Público concluído até junho de 2026
  3. Programa de Infraestruturas e Habitação absorve 33,8% da dotação orçamental
    1. Gastos do IHRU em habitação ascendem, em 2026, a cerca de 1.200 milhões
  4. Isenção do IMT Jovem na compra de casa sobe 2%
  5. PRR financiar 9.367,1 milhões de euros de investimento
  6. Medidas fiscais da habitação só terão impacto em 2027 

Como quer o Governo “travar” a crise na habitação?

O Governo de Luís Montenegro compromete-se, por exemplo, a disponibilizar 59 mil casas nos próximos seis anos, dos quais 33 mil novos fogos a construir com financiamento do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). E mais: na sequência de um acordo assinado recentemente com o Banco Europeu de Investimento (BEI), está prevista a construção de 12 mil casas novas, que integrarão o Programa de Apoio ao Arrendamento.

Quanto à oferta de habitação pública, está previsto, para 2026, um investimento de 930 milhões de euros em programas públicos de promoção e reabilitação destinados a alojar 22 mil pessoas.

A nível fiscal, o Executivo já anunciou a redução para 6% da taxa de IVA na construção de habitações para venda ou arrendamento a preços "moderados" (2.300 euros mensais no arrendamento e 648 mil euros na construção para arrendamento).

No caso do mercado de arrendamento, está previsto um aumento para 900 euros na dedução à coleta de IRS dos encargos com as rendas "moderadas", assim como a redução da taxa de IRS de 25% para 10% nos contratos de arrendamento de habitações a valores de até 2.300 euros mensais. 

Foram ainda anunciados o fim da tributação das mais-valias de IRS na venda de habitações, quando o valor for reinvestido em imóveis para arrendamento a valores "moderados", e a isenção temporária de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) e Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) para o mesmo tipo de imóveis. 

Joaquim Miranda Sarmento
Joaquim Miranda Sarmento, ministro de Estado e das Finanças.Getty images

Mudanças para o setor previstas na proposta de OE2026 

Transferência de imóveis rústicos de domínio privado do Estado para municípios

O Governo quer transferir a propriedade de todos os imóveis rústicos de domínio privado do Estado para os municípios, “sem exigir qualquer contrapartida”, pretendendo mitigar o risco de incêndios. Segundo se lê no documento, “o Estado é proprietário de cerca de 43 mil imóveis rústicos” e, além destes, encontram-se matricialmente inscritos a favor do Estado, “por não terem dono conhecido, mais 65 mil”.

No âmbito da gestão do património imobiliário do Estado, em que se prevê um orçamento total de 852 milhões de euros para 2026, o Governo afirma que “será transferida a propriedade de todos os imóveis rústicos integrados em domínio privado do Estado e que estejam inscritos em nome do Estado na matriz para os respetivos municípios, sem exigir qualquer contrapartida, para promoção da reutilização dos respetivos imóveis, mitigação do risco de incêndios e gestão de proximidade e coesão”.

Quanto ao cadastro da propriedade rústica e ao sistema de monitorização e ocupação do solo, no âmbito dos investimentos estruturantes na agricultura e floresta, o Governo estima um investimento de um milhão de euros em 2026, referindo que houve 17 milhões em 2024 e 60 milhões este ano.

“Será prioritário cadastrar, atualizar e consolidar o inventário do património do Estado, bem como rentabilizar e valorizar o único ativo da Consest - Promoção Imobiliária, S.A.”, lê-se no relatório da proposta do OE2026.

Luz verde para revisão dos Planos Diretores Municipais

Para a promoção da “visão integrada e sustentável do território”, em que se estima 75 milhões de euros para 2026, perspetiva-se a aprovação dos programas regionais de ordenamento do território, assim como a revisão dos Planos Diretores Municipais (PDM).

“Reconhecendo a necessidade de maior agilidade nos processos de planeamento municipal, o Governo pretende simplificar e desburocratizar os mecanismos de revisão dos PDM, facilitando a sua adequação às novas realidades sociais, económicas e ambientais”, refere o documento.

A proposta sugere ainda a consolidação de um sistema cadastral integrado, “para garantir o conhecimento efetivo da propriedade fundiária e do uso do solo”, indicando que “a integração entre o cadastro predial e o cadastro simplificado permitirá melhorar o registo da propriedade, prevenir conflitos, facilitar o ordenamento e criar condições mais favoráveis ao investimento e à valorização do território”.

Sistema de Informação e Gestão de Património Imobiliário Público concluído até junho de 2026

No domínio da modernização, prevê-se o desenvolvimento de “um sistema de informação de suporte à avaliação cadastral simplificada da propriedade rústica”, assim como “uma solução de gestão da informação georreferenciada”.

O relatório da proposta do OE2026 refere ainda que o investimento relativo à implementação do Sistema de Informação e Gestão de Património Imobiliário Público (SIGPIP), para inventariar e cadastrar imóveis na propriedade de entidades da administração pública central, “estará concluído até junho de 2026”.

Casas em Lisboa
Créditos: Gonçalo Lopes | idealista/news

Programa de Infraestruturas e Habitação absorve 33,8% da dotação orçamental

Programa Infraestruturas e Habitação, com um total de 116 projetos, é o programa orçamental que apresenta maior expressão orçamental na proposta de OE2026, com uma verba de 5.841,1 mil milhões de euros, o que equivale a 33,8% do total.

O financiamento nacional do programa ascende a 4.961,9 mil milhões de euros, dos quais 1.028 milhões provenientes das receitas de impostos. Já o financiamento europeu será de 879,2 milhões de euros, dos quais 769,8 milhões de euros provenientes do PRR.

Neste programa, destacam-se os projetos relativos às concessõesconstruçãorequalificação e conservação da ferrovia e conservação da rede rodoviária, a cargo da Infraestruturas de Portugal, S.A. (IP), e o Programa de Apoio ao Acesso à Habitação — 1º Direito e Habituação a custos acessíveis, por parte do IHRU, I.P.

Gastos do IHRU em habitação ascendem, em 2026, a cerca de 1.200 milhões

No capítulo dos investimentos estruturantes da Administração Central, os gastos do IHRU em habitação ascendem, no próximo ano, a praticamente 1.200 milhões de euros. A maior fatia, de cerca de 800 milhões de euros, é destinada aos programas de apoio no acesso à habitação.

parque público de habitação a custos acessíveis recebe 360 milhões de euros, a bolsa de alojamento urgente um total de 28 milhões de euros e a reabilitação do parque habitacional 10 milhões de euros.

A prioridade do Executivo vai para a execução de 59 mil casas públicas, realização de parcerias público-privadas em imóveis do Estado devolutos com aptidão habitacional, através da injeção no mercado de pacotes de imóveis destinados a investidores, designadamente por "concessão" dos mesmos, a começar pelos "imóveis libertados pela concentração de ministérios e entidades no Campus XXI."

No licenciamento urbanístico, o Governo compromete-se com a simplificação, redução da burocracia e maior celeridade dos processos. E para o mercado de arrendamento promete:

  • Rever o regime de arrendamento urbano, garantindo aos proprietários a resolução dos contratos em caso de incumprimento;
  • Alterar os programas de arrendamento, designadamente do arrendamento acessível, através do modelo de contratos de investimento build-to-rent para atrair o investimento privado;
  • Racionalizar todos os programas públicos de apoio à renda.
Crise na habitação em Portugal
Créditos: Gonçalo Lopes | idealista/news

Isenção do IMT Jovem na compra de casa sobe 2%

Também prevista na proposta do OE2026 está uma atualização de 2% dos escalões do IMT, aumentando em cerca de 6.500 euros, para cerca de 330,5 mil euros, o valor de casa isento de imposto para os jovens. O escalão seguinte ainda abrangido pelo IMT Jovem, e ao qual é aplicada uma taxa de 8%, avança, por seu lado, dos 648.022 euros para 660.982 euros. 

O IMT Jovem, recorde-se, começou a ser aplicado em agosto de 2024, contemplando uma isenção total deste imposto, do Imposto do Selo e dos emolumentos de registo para habitações de até 316.000 euros, valor que este ano subiu para 324.058 euros.

Quando o limite da isenção é ultrapassado, aplica-se uma taxa marginal de IMT de 8% até ao montante de 648.022 euros. Acima desse valor, não há isenção nem de IMT nem de Imposto do Selo (IS).

Assim, no próximo ano, uma casa de 600.000 euros vai pagar 0% de IMT e Imposto de Selo até aos 330.539 euros, e 8% de taxa de imposto na parcela entre este valor e o custo da aquisição.

Para quem compra casa sem estar abrangido por esta medida (porque tem mais de 35 anos ou porque já é proprietário de um imóvel habitacional, ou de parte dele) o OE2026 também traz mudanças, havendo lugar a isenção de IMT quando esteja em causa a compra de uma habitação de preço até 106.346 euros.

O valor do IMT em vigor até final deste ano tinha sido atualizado em 2,3% e tem como limite para a isenção os 104.261 euros.

PRR financiar 9.367,1 milhões de euros de investimento

Segundo a proposta de OE2026, o PRR vai financiar um total de 9.367,1 milhões de euros, destinado, sobretudo, aos ministérios da Economia, Finanças, Ambiente e Habitação. Um valor que está, sobretudo, destinado aos ministérios da Economia, Finanças, Ambiente e Energia e Infraestruturas e Habitação que, no conjunto, ficam com 68,5% das verbas do plano.

O Governo estima ainda que o financiamento do PRR, através de empréstimos, se fixe em 2.578,1 milhões de euros, destacando-se os projetos que dizem respeito “às agendas/alianças verdes e mobilizadoras para a inovação empresarial”, aos instrumentos de capital e quase capital do Fundo de Capitalização e Resiliência e, em menor grau, ao parque público de habitação a custos acessíveis.

Já as subvenções devem atingir 6.789 milhões de euros.

Joaquim Miranda Sarmento
Joaquim Miranda Sarmento, ministro de Estado e das Finanças.Getty images

Medidas fiscais da habitação só terão impacto em 2027 

O ministro de Estado e das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, disse que as medidas fiscais em sede de IRS anunciadas para a habitação "só terão impacto em 2027".

Apesar de a redução da taxa de imposto, de 25% para 10%, aplicada aos senhorios nas chamadas rendas moderadas (de até 2.300 euros mensais) começar a ser aplicada já em 2026, a sua tributação só será feita na declaração anual de imposto a entregar a partir de abril do ano seguinte. O mesmo se aplica à dedução à coleta das rendas pagas pelos inquilinos, até ao limite de 900 euros anuais, que apenas serão declaradas no ano seguinte.

Segundo o governante, que falava durante a apresentação da proposta de OE2026 no Ministério das Finanças, em Lisboa, as medidas fiscais para a habitação estão “em processo final legislativo”.
Fonte: OE2026: as novidades para a habitação e imobiliário — idealista/news