Mediação de luxo: “Perdemos muito tempo, ou ganhamos, a falar com pessoas” João Xara-Brasil, Managing Partner da Memeia Portugal, revela os segredos da nova mediadora imobiliária especializada no segmento premium. 08 out 2025 min de leitura A Memeia Portugal, mediadora imobiliária especializada no segmento premium, com um modelo de negócio profundamente personalizado, nasceu este ano na sequência de uma parceria entre a Chiado Invest, consultora portuguesa especializada na assessoria a investidores estrangeiros em Portugal, e a Memeia Imóveis, experiente corretora imobiliária com sede em São Paulo, no Brasil. O segredo de negócio fica bem guardado no baú, mas João Xara-Brasil, Managing Partner da Memeia Portugal, aponta à importância de manter uma relação próxima e de excelência com clientes e potenciais compradores e/ou investidores. “Perdemos muito tempo, ou ganhamos, a falar com pessoas”, diz em entrevista ao idealista/news. Sem rodeios, João Xara-Brasil considera que, por vezes, o mercado residencial não consegue dar resposta à procura existente no segmento de luxo – “Há falta de casas, de produtos mais especiais” – e revela que a Memeia Portugal se posiciona como uma boutique: “Não temos aquela pressão que as grandes mediadoras têm, mas temos a pressão do relacionamento com as pessoas”. Em jeito de desabado, deixa uma mensagem, desafiando as pessoas e empresas a serem melhores, mais exigentes e mais comprometidas, nomeadamente nos serviços que prestam. “Vamos ser mais atenciosos e eficazes no tratamento que damos às pessoas que vêm de fora”, apela. João Xara-Brasil, Managing Partner da Memeia PortugalCréditos: Gonçalo Lopes | idealista/news O porquê de criar agora, em 2025, a Memeia Portugal? A Memeia Portugal é aberta com dois sócios, a Chiado Invest e a Memeia Brasil. A Chiado Invest é uma empresa que desde 2014 se concentrou na consultoria de investimento estrangeiro em Portugal. Ou seja, captamos investimento estrangeiro para o país e ajudamos quem queira investir, seja em infraestruturas, energia, hotelaria e ‘real estate’, que ganhou um enorme peso no processo. Por isso, a Chiado Invest começou a olhar para o ‘real estate’ de forma um pouco diferente. Enquanto consultora tinha de ser independente, mas em alguns casos podia fazer mediação pura. E fizemos alguns negócios, a partir de 2017, com a Memeia Brasil, que tem 30 anos de experiência. Percebemos que existia uma confluência grande de princípios, gostos e de abordagem, até quando os negócios não se faziam, e que os clientes vinham altamente qualificados e bem trabalhados, que quando chegavam cá apenas tínhamos de tentar ir ao encontro dos seus interesses. Vinham focados e com consciência do que seria o investimento deles, e normalmente ficavam surpreendidos, porque Portugal surpreende. Os brasileiros começaram a vir para Portugal [de forma mais acentuada] a partir de 2012, com a instabilidade no Brasil. Tinham uma ideia errada dos portugueses e perceberam que é um país completamente aberto na Europa, seguro, onde se come bem, onde há casas lindas e que fala a mesma língua. Foi aí que começou toda a loucura. E depois, claro, houve os programas de incentivo. "Sentimos que os clientes brasileiros continuam a vir na mesma, continuam com o mesmo entusiasmo por Portugal e, sobretudo, com muito mais conhecimento sobre o que é o país" Sobre o Golden Visa, contribuiu para que os cidadãos brasileiros passassem a investir mais em imobiliário em Portugal? O programa sofreu, entretanto, alterações. Notou alguma diferença? Não notámos, porque somos uma pequena empresa e vamos posicionar-nos um pouco como uma boutique. Sentimos é que os clientes brasileiros continuam a vir na mesma, continuam com o mesmo entusiasmo por Portugal e, sobretudo, com muito mais conhecimento sobre o que é o país. Vão, por exemplo, para a Comporta, porque os paulistanos adoram o ‘Hippie Chic’ de Trancoso e sentem que na Comporta existe o mesmo tipo de ambiente – e a Comporta soube dar resposta a esses sonhos. Depois chegam [a Portugal] e os filhos ficam felizes porque conseguem ir aos restaurantes sozinhos e à noite vão ao telemóvel na rua. Depois come-se lindamente e o custo de vida, obviamente, é bastante inferior ao de Miami (EUA), onde eles investiam em força. Estão encantados. Andamos à procura de negócios interessantes para este tipo de investidores, que ou vêm passar férias, ou viver, ou pós-reformar-se. É verdade que a Memeia Portugal foi criada há pouco tempo, mas há algum número relativo a transações que já nos possa dar? Poso dizer que se vendêssemos os imóveis todos eram valores muito interessantes, na ordem das dezenas de milhões de euros. Temos um cliente, por exemplo, que está à procura de uma casa e que tem um ‘ticket’ altíssimo, mas não consegue comprar, porque ainda não a encontrou. Às vezes o mercado não responde, há falta de casas, de produtos mais especiais. Imóvel no Estoril anunciado no site da Memeia PortugalCréditos: Memeia Portugal Sente que há clientes que não procuram apenas casas de luxo, mas sim uma espécie de ultraluxo, algo ainda mais exclusivo? Posicionamo-nos como uma corretora de alto padrão, que não é necessariamente aquele luxo que se fala de milhões de euros. Um apartamento assinado pelo Aires Mateus ou pelo Siza Vieira [arquitetos conceituados] num sítio muito bonito de Lisboa é um imóvel de alto padrão, e pode ser um T1. "Temos um cliente que está à procura de uma casa e que tem um ‘ticket’ altíssimo, mas não consegue comprar, porque ainda não a encontrou. Às vezes o mercado não responde, há falta de casas, de produtos mais especiais" O alto padrão que queremos incutir em Portugal é o alto padrão no acompanhamento do cliente, na procura dos imóveis, na aproximação com a história dele e da sua família, com a vida que quer ter em Portugal, com aquilo que procura ir ao encontro das suas necessidades e que muitas vezes não sabe que as tem. Em conversas, começamos a perguntar coisas e percebemos que vêm com uma ideia do Chiado, mas acabam a pensar em Campo de Ourique. Os brasileiros estão muito virados, em Lisboa, para Campo de Ourique e Avenidas Novas. Antes era Avenida da Liberdade e Chiado. Começaram a perceber que nas Avenidas Novas, pelas características de bairro, com serviços e transportes, nem precisam de carro. E as casas são de alto padrão. A vida de bairro de Campo de Ourique é uma coisa que os tem atraído imenso. As coisas estão um pouco a mudar. Estamos a falar sobretudo de clientes brasileiros, até porque é o ‘core’ da Memeia Portugal, mas trabalham com outras nacionalidades e também com portugueses, nomeadamente emigrados no Brasil? Neste momento, estamos a atender portugueses, brasileiros, emigrantes de Portugal no Brasil e norte-americanos, que é outro mercado que não é de descurar. Têm ‘tickets’ mais altos, normalmente, e estão a ir muito para o Algarve. O Algarve vai dar que falar com os norte-americanos. A "questão" do Donald Trump [presidente dos EUA] é algo que assusta os brasileiros que estavam em Miami, que começam a vir. Significa, então, que os brasileiros que já têm uma segunda casa em Miami, e são muitos, podem agora deixar de investir nos EUA? Há vários fatores. Em Miami, por exemplo, há o tema dos ciclones, que felizmente nós não temos, mas temos a vida mais barata, a questão da segurança e a língua. Imóvel em Cascais anunciado no site da Memeia PortugalCréditos: Memeia Portugal A procura em Portugal incide mais por apartamentos ou moradias de luxo? Em Lisboa, [os brasileiros] procuram o serviço que têm em São Paulo. Condomínios, prédios novos, não querem nada para obras ou reabilitação, os prédios têm de ter bom aspeto. Não gostam de andares baixos, exatamente por causa da questão da insegurança, a não ser que seja num condomínio. Gostam de ter sempre zona de serviços e o tanque da roupa é uma coisa que faz parte das suas casas, é impressionante. Nós não usamos, mas eles gostam de ter uma área de serviço e um tanque. Mas também notamos que acima dos 50 anos já procuram quintas no Alentejo, negócios de vinho no Douro, outro tipo de vida para estabilizarem, com outra calma. Portanto, neste momento temos [procura para] Lisboa e Cascais, sobretudo, o Douro e o Alentejo para as classes mais elevadas e, agora, o Algarve, com muitos brasileiros também interessados, além dos norte-americanos. Há celebridades entre os clientes? Quem são estas pessoas que procuram investir em casas de luxo em Portugal? Existem brasileiros de famílias com vidas muito interessantes em Portugal, a fazer coisas muito giras, e de quem ficámos amigos, porque sentiram uma enorme segurança no serviço que proporcionámos. São sobretudo empresários brasileiros e famílias de empresários. A “Memeia Portugal representa uma nova forma de fazer mediação”, afirmou em comunicado. O que é que isto significa? Nós perdemos muito tempo, ou ganhamos, a falar com pessoas, a levá-las a passear à volta de Lisboa, a mostrar-lhes aquilo que podem encontrar em cada sítio. E, de facto, esse tempo que lhes estamos a dar não sei se muitas mediadoras terão hipótese de dedicar-se a um cliente dessa forma. E temos, ao mesmo tempo, alguma capacidade de criar empatia com os clientes, e às tantas sabemos o que é que os filhos gostam ou não, o que é que eles querem exatamente em termos de estrutura da casa, o que procuram, as suas expetativas. No fundo, são pessoas que vêm realizar um sonho, não é? "Nós perdemos muito tempo, ou ganhamos, a falar com pessoas, a levá-las a passear à volta de Lisboa, a mostrar-lhes aquilo que podem encontrar em cada sítio. E, de facto, esse tempo que lhes estamos a dar não sei se muitas mediadoras terão hipótese de dedicar-se a um cliente dessa forma" Presamos muito os pedidos de cada pessoa, porque sabemos que está a sair do seu país para viver noutro ou para criar um investimento, por isso tem de se sentir muito bem e segura. E encontrar um imóvel é, no fundo, realizar um sonho de alguém ou de uma família inteira. Muitas vezes vamos fazer visitas com pais e filhos e vamos ouvir também os comentários dos filhos, porque há miúdos que vão dizendo coisas que dão pistas. É ter uma história para contar de um imóvel que vendemos e ter uma história de quem o quer comprar. Isso é algo que não é fácil, às vezes demora muito tempo. Imóvel no Estoril anunciado no site da Memeia PortugalCréditos: Memeia Portugal Daí dizerem que são uma boutique, por ser algo mais personalizado? Não temos aquela pressão que as grandes mediadoras têm, mas temos a pressão do relacionamento com as pessoas. Se percebemos que não podem comprar nada desta vez, virão numa próxima. Não vamos é forçar nada. Há portugueses emigrados no Brasil a querer comprar casa em Portugal? É algo que tem sido mais frequente? Já vendemos várias casas a portugueses que foram para o Brasil, fizeram a sua vida e hoje estão a comprar em Portugal e a fazer metade da vida cá e metade lá, mas não acho que seja uma tendência. O que é muito interessante e tem sido enriquecedor é perceber que as pessoas que chegam cá têm histórias de sucesso inacreditáveis. "Não temos aquela pressão que as grandes mediadoras têm, mas temos a pressão do relacionamento com as pessoas. Se percebemos que não podem comprar nada desta vez, virão numa próxima. Não vamos é forçar nada" Fatores como a instabilidade legislativa e a burocracia em Portugal têm tido impacto no setor imobiliário, nomeadamente aos olhos de que quer investir e/ou comprar casa no país? Sinto, através da Chiado Invest, que há claramente uma desilusão grande, não com a compra de casa, mas em relação aos investimentos, aos licenciamentos, às demoras, ao que se disse e depois não disse. Já perdemos negócios. Temos um investimento para o qual trouxemos investidores brasileiros que está a decorrer, acaba a obra no próximo ano, em que ao fim de dois anos os investidores disseram que queriam vender a sua participação, porque não estavam mais para isto. Depois, os portugueses, que já estão habituados a estas coisas, assumiram a posição deles e conseguiram avançar com o projeto. Um investidor nosso está há quatro anos à espera de licença... E há outra coisa, uma mentalidade que os portugueses têm de mudar: o melhor serviço do mundo que conheço é em São Paulo, em que ao ir a um restaurante, a uma loja, a atenção que é dada… é um serviço inacreditável. Algo que não existe em Portugal. Imóvel no Restelo (Lisboa) anunciado no site da Memeia PortugalCréditos: Memeia Portugal A maior parte dos investidores brasileiros que têm são oriundos de São Paulo? O grande volume que temos tido é de São Paulo, sim, mas também temos clientes do Rio de Janeiro. O setor da mediação imobiliária, tal como todos os outros, está cada vez mais tecnológico, nomeadamente com a chegada da Inteligência Artificial (IA). Ainda assim, o passa palavra e o boca a boca continuam a ser cruciais? Sentimos que os processos de IA ajudam muito na procura de clientes e de ativos e de juntar uns com os outros, mas honestamente não estamos ainda muito profundamente ligados a esse projeto, sabendo que ninguém faz nada sem IA. Nós, por enquanto, ainda podemos viver com o boca a boca. Se fizermos 10% dos negócios que estamos à procura já é muito bom, porque temos alguns a querem fechar-se. Em relação à Chiado Invest, poderemos estar a fechar dois negócios muito emblemáticos para Lisboa, também com brasileiros. "Em Portugal fazem-se coisas muito boas, de enorme qualidade, não só na mediação. Temos pessoas e empresas a trabalhar muito bem os estrangeiros que vêm para Portugal, mas também estamos a dar imensos tiros nos pés. (...) Há um desafio que lanço: sermos melhores, mais exigentes, mais comprometidos e não tentarmos fazer de conta que não se sabe ou não se viu" Ou seja, a Chiado Invest continua a funcionar de forma normal e autónoma, tendo o seu modus operandi? A Memeia Portugal tem as técnicas de mediação e usa todo o ‘know-how’ da Memeia Brasil, adaptado a Portugal, que somos nós que conhecemos bem. No caso da Chiado Invest, fazemos consultoria, temos projetos que apresentamos a clientes e dizemos que podem ser bons, se forem feitos de determinada forma. Disse que há em Portugal uma mentalidade que tem de ser alterada, referindo-se nomeadamente à qualidade dos serviços prestados relacionados com o setor da mediação imobiliária. Que mensagem final gostaria de deixar? Em Portugal fazem-se coisas muito boas, de enorme qualidade, não só na mediação. Temos pessoas e empresas a trabalhar muito bem os estrangeiros que vêm para Portugal, mas também estamos a dar imensos tiros nos pés. Normalmente a tendência é falar – que é verdade – dos governos que mudam, dos licenciamentos que não saem, das inseguranças em relação a determinados processos que estão nas câmaras. Isso acontece e não vamos pisar mais no chão molhado. Mas acho que devíamos focar-nos, cada um de nós, em sermos muito melhores, em prestar a atenção, o serviço e a qualidade das informações e dos trabalhos que fazemos às pessoas que vêm de fora. Muitas vezes nós somos muito culpados por as coisas correrem mal em Portugal. É um desafio que lanço: sermos melhores, mais exigentes, mais comprometidos e não tentarmos fazer de conta que não se sabe ou não se viu. Vamos ser mais atenciosos e eficazes no tratamento que damos às pessoas que vêm de fora. Fonte:Mediação de luxo: “Perdemos muito tempo, ou ganhamos, a falar com pessoas” — idealista/news Partilhar artigo FacebookXPinterestWhatsAppCopiar link Link copiado