João Tiago Aguiar: "O essencial num projeto é manter um conceito forte e coerente" Apaixonado pelo desporto, acabou por dedicar a sua vida à arquitetura. E gosta de tratar cada obra como algo ´tailor-made´. 09 mai 2025 min de leitura Quando entramos no atelier liderado pelo arquiteto João Tiago Aguiar somos impactados com provas físicas das suas paixões: a bola de futebol e as fotografias das casas que projetou com modelos muitos especiais (a mulher e os filhos). João Tiago Aguiar conseguiu mesmo criar uma ligação única e especial entre o desporto e a arquitetura. As oportunidades cruzaram-se: no mesmo ano ganhou o concurso para desenhar um grande hotel e conseguiu que a sua equipa subisse de divisão. Depois deste início "em grande" o atelier trabalhou em todo o tipo de tipologias, incluindo habitação, restauração, serviços, interiores e até mobiliário. Neste caminho recebeu diversos prémios, como o "Surface Design Awards" no Reino Unido por duas vezes, o prémio RENOV 2015 do concelho de Oeiras e foi finalista em várias categorias dos prémios "Archdaily". Em 2020, foi distinguido com o "Best of 2020" pelo website Archello. Em 2021, recebeu o Prémio SIL pelo projeto Avencas Ocean View Residences e o Prémio Construir pela reabilitação da Maison Eduardo Coelho. Em 2022, o atelier foi novamente reconhecido com o Prémio Nacional do Imobiliário pelo projeto Avencas Ocean View Residences e com o Prémio SIL pela Maison Eduardo Coelho. Durante a conversa com o idealista/news, para a rubrica Em casa do arquiteto foi possível sentir a ligação emocional do arquiteto com o seu trabalho. João Tiago Aguiar é transparente. Uma palavra transversal: independentemente do orçamento, acredita que nada deve querer parecer algo que não é. Duplex Campolide Como começou a sua relação com a arquitetura? Foi algo que sempre imaginou seguir? Não, de todo. Eu sou o mais novo de seis irmãos e sempre gostei muito de desenhar, mas adorava desporto. Praticava várias modalidades mas, quando pensava no futuro, via que seguir desporto significava ser professor de Educação Física, e isso não queria. Os meus irmãos insistiam: “Tens jeito para desenho, devias ir para arquitetura.” Mas o meu pai não estava convencido. Dizia: “Arquitetura não tem matemática, tens que ir para Engenharia.” Fiz exames para Engenharia Civil no Técnico, mas, no momento de escolher a primeira opção, segui a minha intuição e escolhi arquitetura. Foi um pouco à revelia do meu pai, mas foi a melhor decisão. Fiz exames para Engenharia Civil no Técnico, mas, no momento de escolher a primeira opção, segui a minha intuição e escolhi arquitetura. E como foi a sua experiência inicial no mercado de trabalho? Assim que terminei o curso, trabalhei em Portugal por seis meses e depois fui para Amesterdão com uma bolsa Leonardo da Vinci, que ajudava jovens arquitetos a entrarem no mercado de trabalho. A ideia era ficar um ano, mas acabei por ficar três. Comecei com tarefas básicas, como fazer maquetes e tirar fotocópias, mas, com o tempo, fui ganhando responsabilidade. No final, já estava a desenvolver conceitos para fachadas e projetos inteiros. Voltei para Portugal em 2000 e trabalhei quatro anos num escritório multinacional em Lisboa. Entretanto, continuei a viver na casa da minha mãe. Foi então que ela me disse: “João, tens quase 30 anos, precisas de pensar na tua vida.” Moradia Vilamoura E foi aí que decidiu abrir o seu próprio atelier? Não diretamente. Ainda jogava futsal federado e um ex-treinador convidou-me para jogar numa equipa pequena que queria subir de divisão. Aceitei. Curiosamente, o presidente desse clube era dono do maior grupo hoteleiro de Lisboa. Eles tinham acabado de comprar o edifício da antiga RTP para o transformar num hotel de cinco estrelas e iam lançar um concurso para escolher o arquiteto. Um professor que conhecia o presidente mencionou que eu era arquiteto. O presidente perguntou-me: “Já fizeste hotéis?” Respondi que sim, mas sempre inserido em equipas de outros ateliers. Ele disse: “Vou convidar oito ou nove ateliers para o concurso. Tu não tens atelier, mas se quiseres apresentar uma proposta, estás convidado.” Juntei-me a um amigo arquiteto e, depois do trabalho, passávamos as noites a desenvolver a proposta. Surpreendentemente, ganhámos! Foi assim que, em 2004, abri o meu atelier com esse projeto, que acabou por ser concluído em 2008. Então, o futebol acabou por ser determinante para a sua carreira... Sim! Ironia do destino: a minha mãe dizia que “a vida não é só futebol”, mas foi graças ao futebol que tive esta oportunidade. Moradia Restelo Depois desse grande projeto inicial, como evoluiu o atelier? Achámos que, depois desse hotel de 30 mil metros quadrados, só viriam projetos enormes. Mas quando o hotel estava quase pronto, no final de 2007, começou a crise financeira. Felizmente, tínhamos feito pequenas remodelações de apartamentos e lojas, e isso tornou-se a nossa principal fonte de trabalho nos anos seguintes. Como foi essa transição para projetos mais pequenos? Foi um desafio, mas também uma oportunidade. Fizemos um apartamento nas Avenidas Novas, que foi publicado em várias revistas e ajudou a atrair mais clientes. Além disso, percebi a importância da fotografia na arquitetura. Durante a crise, muitos escritórios ficaram parados, mas nós continuávamos a documentar e a divulgar os nossos projetos, o que ajudou a manter o atelier visível e ativo. Hills Hotel Lisboa Hoje, o atelier trabalha mais com que tipo de projetos? Atualmente, cerca de 80% do nosso trabalho é habitação. Fazemos desde pequenas remodelações a projetos de grande escala, como edifícios de 150 apartamentos ou empreendimentos inteiros. Temos também projetos de habitação de luxo, casas na Quinta da Marinha, no Restelo… Mas não nos limitamos a um segmento específico. Já fizemos restaurantes, hotéis e escritórios. Atualmente, cerca de 80% do nosso trabalho é habitação. Fazemos desde pequenas remodelações a projetos de grande escala Qual a diferença entre projetar habitação comum e habitação de luxo? A maior diferença não é só o orçamento, mas o próprio cliente. Há clientes com pouco dinheiro que confiam totalmente no arquiteto e querem ser surpreendidos. E há clientes de luxo que, apesar do grande orçamento, querem impor demasiadas ideias, muitas vezes baseadas no que viram em revistas. Isso pode limitar a criatividade do arquiteto. O essencial num projeto é manter um conceito forte e coerente. Se há demasiadas influências externas, corre-se o risco de criar um espaço que parece uma manta de retalhos e que rapidamente se torna cansativo. O seu atelier tem uma abordagem muito personalizada. Como define essa filosofia? Gostamos de tratar cada projeto como algo 'tailor-made', quase como um alfaiate faz um fato à medida. Cada cliente e cada espaço são únicos. Além disso, acreditamos na honestidade dos materiais. Se for para usar madeira, usamos madeira de verdade, não vinil a imitar madeira. Se for para usar pedra, usamos pedra, não cerâmica que finge ser pedra. Esse princípio vale tanto para os projetos como para a forma como lidamos com os clientes. Gostamos de tratar cada projeto como algo tailor-made, quase como um alfaiate faz um fato à medida. Cada cliente e cada espaço são únicos. Moradia Restelo Existe algum tipo de projeto que ainda gostaria de fazer? Sim, gostava muito de projetar uma igreja. Já fiz uma capela privada, mas gostava de fazer algo maior. A arquitetura, no seu melhor, tem um impacto emocional e espiritual muito forte. Uma igreja é um espaço onde a luz e o espaço assumem um papel essencial, criando um ambiente de introspeção e conexão. Para terminar, qual o maior desafio de gerir um atelier de arquitetura? A gestão de um atelier não é só arquitetura, é também ser empresário. Não há formação específica para isso. É preciso encontrar um equilíbrio entre crescer e manter a sustentabilidade. Nunca quis dar um passo maior que a perna e correr o risco de não conseguir pagar a equipa. Felizmente, nunca tive que despedir ninguém e espero continuar assim. Fonte:João Tiago Aguiar: "O essencial num projeto é manter um conceito forte e coerente" — idealista/news Partilhar artigo FacebookXPinterestWhatsAppCopiar link Link copiado