compra de casa em Portugal por estrangeiros voltou a estar no centro do debate político e do setor imobiliário, depois de o Governo da AD  - no âmbito do "plano de choque" que lançou para tentar resolver a crise na habitação - ter anunciado o agravamento do IMT para estes compradores, no caso de viverem fora do país. Mas a verdade é que, tal como mostram os dados oficiais do INE, os não residentes em Portugal pagam mais pelas casas que compram, mas representam uma pequena parte das casas vendidas em território nacional. Nunca pesaram mais de 8% no total de transações, nos últimos sete anos, e esta fatia tem vindo a reduzir-se para novos mínimos desde o fim dos vistos gold e alterações no Regime de Residentes Não Habituais (RNH) - levados a cabo pelo anterior governo socialista.

Na passada quinta-feira, dia 25 de setembro, o primeiro-ministro Luís Montenegro anunciou um conjunto de medidas para a habitação. Neste pacote que visa aumentar a oferta de casas a preços acessíveis está incluído o agravamento do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) para a compra de habitações por parte de cidadãos não residentes em Portugal, excluindo assim os emigrantes e estrangeiros residentes. No entanto, o valor da penalização para estes investidores, por via de um aumento do imposto, não foi dado a conhecer pelo Executivo até agora.

Foi neste contexto que o idealista/news mergulhou nos dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) para descobrir qual é, afinal, a representatividade dos estrangeiros com residência fora do país na compra de casas em Portugal. No segundo trimestre de 2025, os cidadãos não residentes compraram um total de 2.107 habitações (-14,5% face ao período homólogo), o que corresponde a 4,9% do total de casas vendidas no país. E este foi mesmo o menor peso dos estrangeiros nas transações desde 2021.

Casas vendidas em Portugal por residentes e não residentes


Número
 
de casas vendidas a residentes
Número
 
de casas vendidas a estrangeiros
10 00020 00030 00040 000
34,8k
2,1k
34,5k
2,2k
37,3k
2,3k
39,4k
2,3k
34,3k
2,1k
25,2k
1,2k
33,6k
2k
37,1k
2,1k
33,2k
1,5k
40k
1,7k
41k
2,5k
42,6k
3,3k
41k
2,6k
40,8k
2,8k
39,5k
2,8k
35,9k
2,6k
32k
2,5k
31,1k
2,5k
31,5k
2,7k
31,5k
2,6k
31k
2,1k
34,7k
2,5k
38,3k
2,7k
42,6k
2,6k
39,3k
2,1k
40,8k
2,1k
1T2019
2T2019
3T2019
4T2019
1T2020
2T2020
3T2020
4T2020
1T2021
2T2021
3T2021
4T2021
1T2022
2T2022
3T2022
4T2022
1T2023
2T2023
3T2023
4T2023
1T2024
2T2024
3T2024
4T2024
1T2025
2T2025
Gráfico: idealista/newsFonte: INECriado com Datawrapper

A linha temporal que remonta a 2019 mostra, aliás, que o peso dos estrangeiros nunca superou 8% do total de casas vendidas no país – por outras palavras, foram os residentes em Portugal que assumiram sempre a grande maioria das compras. Este peso máximo dos investidores internacionais no número total de transações foi registado no verão de 2023, mesmo antes do fim dos vistos gold para investimento imobiliário e numa altura em que a compra de casas pelos portugueses estava ainda em baixa, afetada pelos altos juros (a Euribor rondava os 4%), a par do então baixo nível médio de poupanças e da alta inflação.

Desde esse verão ‘quente’, a tendência tem sido clara: os estrangeiros que não residem no espaço luso têm vindo a perder representatividade na compra de casas em Portugal, a qual terá sido agravada também pelo término do antigo regime para Residentes Não Habituais (RNH) e a sua substituição por outro mais restrito no início de 2024. Além disso, os portugueses ganharam poder de compra com a queda dos juros e da inflação, refletindo-se na maior aquisição de imóveis residenciais a partir da primavera do ano passado.

Embora o valor investido em habitação por estrangeiros desde fora seja mais representativo no total nacional do que o número de transações, observou-se também um arrefecimento do seu peso nos últimos anos: passou de cerca de 13% do total nacional no fim de 2023 para apenas 8% no segundo trimestre de 2025. O investimento na compra de casas em Portugal por estrangeiros somou quase 825 milhões de euros entre abril e junho deste ano, menos 5% face ao período homólogo.

Estrangeiros a comprar casa em Portugal

Peso das casas compradas e do valor investido por estrangeiros face ao total nacional


Peso do valor investido
Peso das compras de casa
1T20191T20201T20211T20221T20231T20240010%10%1T20191T20201T20211T20221T20231T20240010%10%
Gráfico: idealista/newsFonte: INECriado com Datawrapper

E quem se tem vindo a afastar mais do mercado residencial nacional são os compradores que vivem fora da União Europeia (UE) – como os brasileiros e norte-americanos, por exemplo. Os mesmos dados do INE revelam que estas famílias e investidores compraram 995 casas no segundo trimestre de 2025, menos 18,6% do que no período homólogo, tendo o valor do investimento também caído 8,4% para cerca de 463 milhões de euros. No mesmo período, os estrangeiros que vivem na UE compraram menos casas (-10,5%, totalizando 1.112 transações), o que acabou por se refletir em baixa no total investido (-1% para 362 milhões de euros).

Agora resta saber qual será o impacto na compra de casas por estrangeiros no país se o agravamento do IMT anunciado pelo Governo for aprovado pelo Parlamento - note-se que a coligação AD não tem maioria absoluta. Por seu lado, a nova versão da lei dos estrangeiros, que também pode ter efeitos nos negócios imobiliários, já teve luz verde na Assembleia da República, mas ainda tem de ser apreciada pelo Presidente da República  - e Marcelo Rebelo de Sousa poderá voltar a enviá-la para o Tribunal Constitucional.

Na apresentação desta medida, Miguel Pinto Luz garantiu que “Portugal não vai deixar de atrair investimento estrangeiro”, tratando-se de “uma medida de justiça que vai trazer mais equidade e vai redistribuir melhor a riqueza”, rejeitando a atribuição de culpas aos estrangeiros pelo aumento dos preços das casas.

Mas esta visão é diferente de quem está no setor. Aliás, o maior afastamento do investimento estrangeiro do país é o principal receio apontado pelos vários profissionais do setor, que alegam que os cidadãos internacionais não compram as mesmas casas que os portugueses, garantindo geralmente transações com valores bem mais elevados e dinamizando a economia.

Estrangeiros a comprar casa em Portugal
Freepik

Estrangeiros compram casas mais caras que portugueses – mas diferença tem vindo a cair

O mesmo horizonte temporal do INE (referente aos últimos sete anos) revela que os estrangeiros sempre compraram casas por preços mais elevados do que os portugueses. A maior diferença foi registada no fim de 2021, altura em que os cidadãos internacionais desembolsaram mais do dobro do valor por uma habitação (cerca de 345 mil euros) do que os residentes no país (166 mil euros).

Desde então, a diferença entre o preço médio das habitações adquiridas por estrangeiros e portugueses tem assumido uma tendência decrescente por via do aumento do custo da habitação no mercado nacional. No segundo trimestre de 2025, o valor médio das casas adquiridas por estrangeiros foi 69% superior face à média das casas compradas por portugueses.

Este período assinala, aliás, novos máximos históricos dos preços médios das casas vendidas quer a portugueses (232 mil euros), quer a estrangeiros (391 mil euros), depois de terem crescido em termos anuais 15% e 11%, respetivamente.

Preços das casas compradas por estrangeiros e residentes

Preços médios das casas compradas por estrangeiros e residentes em Portugal (euros)
Diferença entre os preços médios das casas compradas por estrangeiros e residentes (%)

Table with 4 columns and 26 rows. (column headers with buttons are sortable)
Período Preço das casas estrangeiros (euros) Preço das casas nacionais (euros) Diferença
1T2019 267 907
267 907
267 907
134 652
134 652
134 652
99%
99%
99%
2T2019 271 483
271 483
271 483
139 880
139 880
139 880
94%
94%
94%
3T2019 255 696
255 696
255 696
140 055
140 055
140 055
83%
83%
83%
4T2019 270 642
270 642
270 642
140 152
140 152
140 152
93%
93%
93%
1T2020 297 852
297 852
297 852
150 649
150 649
150 649
98%
98%
98%
2T2020 288 690
288 690
288 690
150 253
150 253
150 253
92%
92%
92%
3T2020 286 166
286 166
286 166
144 620
144 620
144 620
98%
98%
98%
4T2020 289 044
289 044
289 044
148 428
148 428
148 428
95%
95%
95%
1T2021 295 330
295 330
295 330
155 764
155 764
155 764
90%
90%
90%
2T2021 319 903
319 903
319 903
159 534
159 534
159 534
101%
101%
101%
3T2021 313 760
313 760
313 760
160 403
160 403
160 403
96%
96%
96%
4T2021 345 088
345 088
345 088
166 436
166 436
166 436
107%
107%
107%
1T2022 330 369
330 369
330 369
176 573
176 573
176 573
87%
87%
87%
2T2022 353 743
353 743
353 743
178 896
178 896
178 896
98%
98%
98%
3T2022 335 923
335 923
335 923
180 505
180 505
180 505
86%
86%
86%
4T2022 328 096
328 096
328 096
181 117
181 117
181 117
81%
81%
81%
1T2023 350 639
350 639
350 639
186 980
186 980
186 980
88%
88%
88%
2T2023 343 731
343 731
343 731
194 064
194 064
194 064
77%
77%
77%
3T2023 328 904
328 904
328 904
195 807
195 807
195 807
68%
68%
68%
4T2023 350 135
350 135
350 135
198 580
198 580
198 580
76%
76%
76%
1T2024 337 203
337 203
337 203
194 567
194 567
194 567
73%
73%
73%
2T2024 353 211
353 211
353 211
202 140
202 140
202 140
75%
75%
75%
3T2024 353 437
353 437
353 437
212 099
212 099
212 099
67%
67%
67%
4T2024 370 041
370 041
370 041
216 213
216 213
216 213
71%
71%
71%
1T2025 376 553
376 553
376 553
224 850
224 850
224 850
68%
68%
68%
2T2025 391 383
391 383
391 383
231 616
231 616
231 616
69%
69%
69%

Tabela: idealista/newsFonte: INECriado com Datawrapper

Desagregando por domicílio fiscal dos compradores internacionais, observam-se diferenças expressivas. Quem vive fora da UE tem vindo a comprar casas bem mais caras do que quem reside dentro de fronteiras europeias. Entre abril e junho deste ano, a diferença foi de 43% com os compradores fora da UE a desembolsarem em média 465 mil euros por uma habitação. Já os compradores residentes na UE pagaram, em média, 325 mil euros por uma casa.

Contas feitas, verifica-se que os cidadãos internacionais que vivem fora da UE compraram casas pelo dobro do valor dos residentes em Portugal. Já os compradores que vivem na UE adquiriram habitações 40% mais caras que os portugueses. Os dados do INE sugerem, assim, que os estrangeiros, sobretudo que moram fora da União Europeia, tendem a focar o mercado residencial mais premium não competindo diretamente com a maioria dos compradores portugueses.
Fonte:Estrangeiros no olho do furação apesar de queda na compra de casas — idealista/news