Crédito habitação: "Achamos que ainda haverá descidas da Euribor" Responsável do Novo Banco revela tendências de mercado, o papel dos intermediários de crédito e evolução das taxas. 18 jun 2025 min de leitura Numa altura em que o mercado imobiliário continua a adaptar-se a novos desafios — desde a inflação às taxas de juro, passando pelas mudanças no perfil dos compradores — o crédito habitação está também a viver uma fase de transição. Para compreender as dinâmicas atuais e antecipar os próximos passos, o idealista/news entrevistou Sandra Ramos Dias, do Departamento de Desenvolvimento e Marketing do Novo Banco, que traça um retrato realista e aprofundado do setor. A responsável destaca que, apesar da descida da Euribor estar a contribuir para um aumento na procura de empréstimos para a compra de casa, o comportamento dos clientes nem sempre segue a lógica das taxas de juro. A produção de crédito habitação tem crescido, influenciada por fatores como o regresso de estrangeiros ao mercado português e os incentivos fiscais destinados aos jovens. No entanto, Sandra Ramos Dias sublinha que estas medidas — como a isenção de IMT e a garantia pública — devem ser analisadas com cautela, já que nem sempre chegam a quem mais precisa. A conversa - que aconteceu antes de ser tornada pública a venda do Novo Banco pela Lone Star aos franceses do BPCE - centrou-se também nas soluções de crédito habitação que têm maior procura. O destaque vai para a taxa mista, especialmente quando associada à campanha de cashback do banco, que devolve até 2% do valor contratado aos clientes — uma oferta que tem tido grande adesão. Ainda assim, a responsável admite que o cliente português mantém a preferência por taxas variáveis, tendência que poderá reforçar-se caso a Euribor continue a descer nos próximos meses. idealista/news Outro tema central da entrevista foi o papel crescente dos intermediários de crédito, que atualmente representam uma parte significativa da produção de crédito no setor bancário. Para Sandra Ramos Dias, estes profissionais são fundamentais para combater a iliteracia financeira, descomplicar o processo de contratação e garantir maior proximidade com o cliente. E mesmo perante a instabilidade geopolítica e económica, a visão transmitida é de confiança: o mercado adapta-se, os bancos acompanham e os clientes continuam a procurar soluções para concretizar o sonho da casa própria. Como avalia a evolução do mercado de crédito habitação nos últimos anos? O mercado de crédito habitação comporta-se de uma forma muito interessante. Obviamente que tem subido, isso não é segredo nenhum. Os bancos estão a fazer mais crédito habitação. Há alguma influência da descida das taxas, da Euribor, e também dos spreads que os bancos têm feito. Mas observámos no passado coisas curiosas: mesmo quando as taxas estavam elevadas, continuava a haver muito crédito habitação. Portanto, nem sempre a evolução da produção de crédito nos bancos está diretamente ligada à evolução das taxas, o que é um aspeto interessante do produto. O que estamos a ver agora é um aumento da produção, sim, mas achamos que existe tendência para estabilizar, acompanhando a estabilização das taxas. A venda das casas também aumentou, por vezes devido a fatores externos, como a subida da procura por parte dos estrangeiros. No Novo Banco, temos uma oferta muito direcionada para estrangeiros, com condições iguais às dos clientes nacionais. Isso fez com que os clientes estrangeiros passassem a ter um peso significativo. Provavelmente, seremos dos bancos com maior percentagem de clientes estrangeiros, até porque temos capacidade de análise de rendimentos internacionais — o que não é nada fácil, por exemplo, no caso de brasileiros ou americanos com documentos muito extensos. Nem sempre a evolução da produção de crédito nos bancos está diretamente ligada à evolução das taxas, o que é um aspeto interessante do produto. Nós também vínhamos de uma fase em que fazíamos pouco crédito. Quisemos ganhar peso e quota no mercado. Essa combinação com a redução da Euribor e a entrada de novos clientes, seja por imigração ou por investidores com visto gold, ajudou ao aumento da produção de crédito. Freepik A isenção de IMT e garantia pública têm vindo a impulsionar o crédito da casa para jovens até aos 35 anos. Têm sentido essa tendência? Sim, claramente. E não só isso. A carga fiscal no crédito habitação era elevada, e esse benefício veio ajudar os jovens. Além disso, alguns bancos — nós incluídos — também retiraram internamente as comissões. Ou seja, os jovens beneficiam da garantia do Estado, da isenção fiscal inicial e do esforço dos bancos em tornar o crédito mais acessível. Acho importante que se pense também na classe média, que hoje, com os rendimentos que tem, enfrenta grandes dificuldades em comprar casa e manter o serviço da dívida. Quais são atualmente as vossas ofertas de crédito habitação mais atrativas – taxa mista, variável ou fixa? A taxa mista tem tido uma grande evolução e crescimento. É maioritariamente o que os bancos têm vindo a fazer. Tem a vantagem de, durante um período, os clientes saberem com o que contam. Portugal, no entanto, continua a ser um país de taxa variável. Já começamos a observar tendência para voltar à taxa variável à medida que a Euribor desce. Os portugueses não gostam muito de taxa fixa. E mesmo quando discutimos internamente a melhor altura para fixar taxas, nunca há certezas. Acabamos quase sempre por optar pelas taxas mistas. Acho importante que se pense também na classe média, que hoje, com os rendimentos que tem, enfrenta grandes dificuldades em comprar casa e manter o serviço da dívida. A nossa aposta vai para taxas com períodos fixos de dois ou cinco anos. A Euribor mais utilizada é a de 12 meses, que também é, no fundo, uma taxa mista: tem 12 meses com a mesma prestação e depois passa a variável. O crédito habitação é um produto cada vez mais semelhante de banco para banco. Procuramos algo que nos diferencie e que traga valor ao consumidor. Freepik Temos uma oferta para todos — jovens, estrangeiros, clientes com mais de 50 anos. Diria que o Novo Banco tem a oferta mais completa do mercado. E isso é especialmente relevante numa sociedade envelhecida. Para quem tem mais de 50 anos, oferecemos condições atrativas e algumas facilidades no seguro de vida. A partir dos 65 anos, dispensamos o seguro de vida, e permitimos crédito até aos 80 anos, o que diminui a prestação e ajuda bastante. Os portugueses não gostam muito de taxa fixa. E mesmo quando discutimos internamente a melhor altura para fixar taxas, nunca há certezas. Acabamos quase sempre por optar pelas taxas mistas. A nossa oferta estrela neste momento é a taxa mista com cashback: devolvemos ao cliente 1% do valor do crédito se optar por taxa fixa a dois anos e 2% se for a cinco anos — sem qualquer limite. Essa devolução aplica-se tanto a 100 mil como a 1 milhão de euros. Está a ter um sucesso enorme. Têm vindo a melhorar e a diversificar a vossa oferta com a descida da Euribor? Estamos a estudar constantemente a Euribor. Quando acharmos que a taxa variável deve ser mais divulgada do que a taxa mista, fá-lo-emos. Neste momento, com a taxa mista a oferecer previsibilidade inicial e vantagens diretas como o cashback, continua a ser a opção mais interessante. Mas estamos atentos e preparados para ajustar a nossa oferta. Como avaliam o papel dos intermediários de crédito? A intermediação de crédito é cada vez mais importante. Há bancos que atingem 70% de produção através de intermediários. No nosso caso, não os vemos como externos — são quase parte do banco. Desde a legislação de 2017 que trabalhamos de forma mais estruturada com estes parceiros, que antes eram mediadores imobiliários. O peso é tão grande que damos formação interna e externa a estes intermediários. A nossa oferta estrela neste momento é a taxa mista com cashback: devolvemos ao cliente 1% do valor do crédito se optar por taxa fixa a dois anos e 2% se for a cinco anos — sem qualquer limite. Essa devolução aplica-se tanto a 100 mil como a 1 milhão de euros. Está a ter um sucesso enorme. São os grandes divulgadores das nossas ofertas — seja para jovens, maiores de 50 anos ou taxas com cashback. Estão muito envolvidos e ajudam-nos a chegar a mais clientes. Qual é a mais-valia do intermediário para o cliente? A figura do intermediário de crédito surgiu para defender o consumidor. Ajuda a descomplicar e traduzir a linguagem bancária. Em Portugal, existe uma grande iliteracia financeira. Muitas pessoas falam de taxas de esforço ou spreads sem perceberem verdadeiramente o impacto na sua vida. E mais: o pagamento ao intermediário é feito pelo banco, não pelo cliente, o que garante isenção. Os bancos pagam valores muito semelhantes, o que evita que o intermediário defenda um banco específico em causa própria. A intermediação de crédito é cada vez mais importante. Há bancos que atingem 70% de produção através de intermediários. No nosso caso, não os vemos como externos — são quase parte do banco. Além disso, em zonas do país sem cobertura bancária, o intermediário pode fazer o acompanhamento completo ao cliente. E há quem tenha medo de entrar num banco — tentámos resolver isso com a remodelação dos balcões, tornando-os acolhedores, como se fossem a casa das pessoas. O intermediário ajuda a ultrapassar esse medo. Acompanha o cliente ao banco e torna o processo mais fluido. Com a regulação crescente e documentação cada vez mais exigente, este apoio é crucial. Como antecipam a evolução da Euribor até ao final do ano? E no próximo? Sem bola mágica, mas achamos que ainda haverá alguma descida da Euribor. É provável que estabilize um pouco abaixo dos 2%. Se isso acontecer, as taxas variáveis poderão tornar-se mais interessantes. Claro que tudo depende da inflação e da evolução do mercado, já que somos uma pequena economia muito exposta ao exterior. Freepik Qual é a vossa visão sobre a evolução das taxas diretoras do BCE nos próximos meses? Esperamos que haja uma descida moderada. Mas vivemos um tempo de grande incerteza — inflação, política internacional, decisões do BCE — tudo influencia. Achamos que ainda poderá haver aumento do crédito habitação e da venda de casas, embora o crescimento seja mais moderado. Notamos um aumento das licenças de construção, o que poderá trazer mais habitação nova para o mercado. De que forma a política externa pode influenciar o mercado financeiro e a política monetária? Achávamos que o grande desafio seria a transformação digital, mas fomos surpreendidos por guerras como a da Ucrânia. Essa instabilidade tem impacto direto: inflação, subida de taxas, retração de investidores, redução de financiamento. Vivemos um tempo de grande incerteza — inflação, política internacional, decisões do BCE — tudo influencia. Mas achamos que ainda poderá haver aumento do crédito habitação e da venda de casas, embora o crescimento seja mais moderado. O mercado imobiliário sente logo esses impactos — seja por via da retração dos bancos ou dos promotores, seja pelos próprios compradores que adiam decisões. Ainda assim, acredito que o mercado se adapta. Continuaremos a fazer crédito, os clientes continuam a precisar de casa, e o banco continuará a ajustar-se. Vejo o futuro com otimismo. Fonte: Euribor vão baixar mais - diz Novo Banco Partilhar artigo FacebookXPinterestWhatsAppCopiar link Link copiado